Antigo Viaduto de Mora
Amnésia
Muitas vezes a paisagem não nos consegue responder, isto é, dar quaisquer indicações sobre o que ali se passou. Quando descobrimos a ponte abandonada de Mora, conseguimos, no máximo, chegar a uma conclusão: era uma vez uma estrada que já não existe. Nada nos dá a entender que ali passou um troço da hoje mítica EN2, a estrada que atravessa Portugal de norte a sul.
Não se observando, à esquerda ou à direita, vestígios do tracejado rodoviário, o viaduto em ruínas lembra um corpo amputado, isolado no meio de pastos.
Quando o ser humano deixa de cuidar do que construiu, aparecem os sinais vitais de uma natureza que retoma sempre o seu lugar: uma azinheira cresce em cima da ponte, alheia ao futuro das suas raízes; por baixo, uma coruja das torres montou o ninho num dos vãos, entre as traves de cimento.
Também não se observam vestígios do motivo que terá levado a erguer-se esta ponte. As marcas dos rodados de um trator no terreno de pasto seco indicam que estamos num terreno cultivado. O que terá levado a remover toda a infraestrutura, a apagá-la do mapa, exceto o viaduto?
Breve
O antigo viaduto de Mora servia para dar passagem à linha de caminho de ferro que ligava Mora a Évora. Com uma extensão de apenas 60 quilómetros, este ramal foi construído no início do século XX, após os pedidos insistentes dos agricultores para terem uma via de comunicação que os ajudasse a acelerar a economia local, uma vez que Évora era, na altura, o centro económico do Alentejo. Os primeiros comboios da chamada Linha de Ponte de Sor ou Linha de Mora funcionaram ainda a carvão e passavam apenas uma vez por dia — às sete da manhã — regressando à estação à uma da manhã.
Em Mora, há ainda quem tenha na memória o som da locomotiva a entrar e sair da vila, acompanhada de densas nuvens de fumo. Nos anos 90, dada a escassez de passageiros e de mercadorias, desativou-se o ramal, porque se considerou que não compensava mantê-lo em serviço.
Este e muitos outros troços de caminho de ferro serviram apenas por um breve período de tempo, devido ao advento do automóvel. O desenho das vias rodoviárias viria a levar à ascensão económica e social de povoações à beira da estrada, ficando condenadas aquelas por onde antes passava o comboio.
As longas retas de vales artificiais, escavados para dar caminho ao comboio, darão caminho a bicicletas. Que nada se desperdice.